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ATIVIDADE FÍSICA E VIDA

18.jan.2013

ATIVIDADE FÍSICA E VIDA


*Adriana Fayad Campos

Hoje em dia andamos tão sedentários, que ter tempo para cuidar do corpo virou luxo para poucos. Nossa vida é tão facilitada por tecnologias de todo tipo: de informação, de comunicação, de transporte mais rápido, que nos perdemos do nosso corpo e do que ele pode e pede.

Andar, por exemplo, era uma atividade natural para o ser humano, desde os tempos primordiais. Na verdade, tornarmo-nos bípedes foi um grande diferencial na nossa evolução, pois ao manter a postura ereta, pudemos apreciar melhor o horizonte, e assim ver mais longe. “Caminhar sobre os próprios pés” é até sinônimo de independência, autonomia.  Tudo que víamos, era só caminhar até ali e pegar. Que alegria é para um bebê de um ano conseguir essa proeza! Tropeçando e mal se equilibrando - lá vai ele - pegar o brinquedo desejado, sem precisar pedir para a mãe.


"Este é um pequeno passo para o homem, um salto gigantesco para a humanidade"
(Neil Armstrong)

 

Atualmente, não precisamos mais nos deslocar até nosso objetivo com nossas próprias pernas. Podemos comprar pizza por telefone, eletrônicos, roupas, produtos dos mais variados tipos pela internet, movendo apenas um dedo da mão. Nunca foi tão fácil chegar ao se quer. Até mesmo missas podemos assistir por DVD. Ir ao trabalho, de carro, sair pra passear também, fazer compras. Caminhar tornou-se quase fútil e improducente, diante do problema de horários apertados que vivemos diariamente, com tantos compromissos. O ser humano é o único animal que se senta para se deslocar, ao entrar em seu carro. Qualquer outro animal levanta-se do chão para se locomover.

Nossa solução para essa alienação de algo tão básico, foi ritualizar o que sempre fora natural. Marcamos hora para caminhar, duas ou três vezes por semana, sempre no mesmo horário. Assemelhamo-nos aos presidiários que têm sua hora do banho de sol. Ficar ao sol é natural para qualquer pessoa livre, que sai à rua quando quer. Para os presos, é um luxo. Andar, que era nosso destino, pois nosso corpo veio programado biologicamente para isso, tornou-se atividade ritualizada, a fim de diminuir a alienação de nosso próprio corpo e por um desencargo de consciência. Mas um ritual nunca terá a naturalidade do ato original.

O sedentarismo é um fator da vida moderna que produz muito adoecimento, porque o corpo tem potencial para muito mais do que a sub-utilização que dele fazemos. Não é novidade mais, para ninguém, que atividade física bem orientada, aumenta a qualidade de vida em qualquer idade. Se você irá precisar de um andador ou poderá caminhar sem ajuda na velhice, depende do uso que faz desse equipamento maravilhoso que é seu corpo, desde agora. Mas falar em equipamento também é insuficiente, pois não somos uma máquina.

Nosso corpo é o único objeto que temos e somos ao mesmo tempo. Nós somos alma, mas somos nosso corpo também. E ao mesmo tempo, apesar desta imanência, também possuímos um corpo. Quando vivemos nosso corpo como algo que possuímos, podemos fazer dele o que bem quisermos, moldá-lo, vesti-lo, exercitá-lo, e até mesmo tirar partes dele, como nas cirurgias plásticas mais drásticas. É nosso, dispomos dele, como de um objeto, entre tantos.

Quando no entanto, vivemos nosso corpo como algo que somos, muda um pouco. O corpo é o campo da dor e do gozo. É o campo do afeto, do sentimento.  Quando queremos acarinhar alguém que está triste, o toque físico se torna imprescindível, porque não há forma melhor de transmitir calor humano do que com o carinho do toque, do abraço, do afago nas costas. Mãos quentinhas acariciam, mãos frias agridem. O bebê sai do útero quentinho da mãe e é recebido pelas luvas frias do médico, numa sala refrigerada. O colo da mãe é morno, conforta... o choro cessa na hora.

O corpo que a gente é, sofre, e tem prazer. Vibra com uma emoção, uma paixão, palpita e treme. Entra em agonia numa dor, mesmo da alma. Quem já perdeu um ente querido próximo, sabe como a dor dilacera e faz o corpo parecer um fardo. Ou quando a tristeza é suficiente pra fazer arfar o peito, mas não para subirem as lágrimas aos olhos, de tanto se reprimir pra não chorar, não sentir. E o quanto é prazeroso o ato sexual praticado com amor e cumplicidade, pois ali o limite entre onde um começa e o outro termina se confunde, na fusão amorosa. O quanto a alegria nos faz levitar “a cinco centímetros do chão”.

Então como devemos encarar nosso corpo? Como posse ou como nós mesmos? Ambos, talvez, mas em momentos diferentes? Como posse, quando isso facilitar algo muito dolorido. No filme “127 Horas” o rapaz cai num abismo entre rochas e fica preso pelo braço, passando dias ali e morrendo aos poucos, até que decide amputar o braço para conseguir se salvar. Nesse momento é necessário encarar seu próprio braço como um objeto a ser repelido, e não como parte de si mesmo, para suportar a dor. Se o apego for o de algo que faz parte de si, ele não conseguirá fazê-lo. A vida é maior que uma parte do seu corpo. O corpo-sujeito é mais importante naquele momento do que o corpo-objeto.

“Sei que preciso me exercitar, mas me dá uma preguiça!” É o que mais se ouve as pessoas falarem. Ou ainda “Bem que eu queria me exercitar, mas não tenho tempo pra isso”. Geralmente isso ocorre por duas razões: 1) A crença de que nosso corpo pode esperar a gente se lembrar dele, ou seja, depois de todas as outras prioridades e se sobrar tempo; 2) O hábito de achar que qualquer atividade física ajudará.  A “preguiça”, ou falta de vontade de se mexer, em geral resulta da falta de identificação entre a atividade escolhida e a pessoa.  É importante que você goste da atividade que fará, pois se isso não acontecer, o risco de abandoná-la após um mês ou dois é muito grande. Procure com calma, consulte um profissional de educação física e converse com ele, que encontrará alguma que não lhe seja tão aversiva, são tantas as opções...

No caso do caminhar de que falava há pouco, o ideal seria que esse caminhar não fosse algo excluído do seu dia normal, mas sim algo encaixado na sua rotina, como ir a pé para o trabalho, por exemplo. Se o trabalho é longe demais, estacionar o carro algumas quadras antes, para andar nem que seja aquele pequeno trecho. Quando temos a própria saúde (e saúde compreendida como um bem-estar global) como prioridade, ao lado das outras, usamos de criatividade e resolvemos esses problemas.

Em última instância, sabemos que mais cedo ou mais tarde nosso corpo cobrará de nós, com juros, o esquecimento e o pouco caso para com ele – para conosco.  Nascemos neste corpo e nele sofremos, nos alegramos, mudamos, sentimos e vivemos toda a nossa vida; até que chegará o momento de deixá-lo, então devíamos tratar esse nosso companheiro com muito mais carinho.

Pergunte a si mesmo: seu corpo é seu parceiro ou seu adversário? A resposta depende de como você vem lidando com ele.


*Adriana Fayad Campos

CRP: 12.938/4ª r.

adrianafayad@yahoo.com.br

- Mestre em Psicologia Aplicada pela UFU – Uberlândia/MG
- Especialista em Psicologia do Esporte pela UniFMU – São Paulo/SP
- Psicóloga clínica em Catalão/GO
- Docente no Centro de Ensino Superior de Catalão/GO (CESUC)

Artigos publicados:
Delineando a identidade do atleta contemporâneo: a Teoria dos Campos no campo desportivo. Autoria: Adriana Fayad Campos, Maria Lúcia C. Romera e Cláudio V. de L. Ferreira. In: MONZANI, Josette & MONZANI, Luiz R (Orgs.). Fábio Herrmann: Uma viagem Psicanalítica.   São Carlos: Pedro e João Editores, selo Olhar, com o apoio do CECH/UFSCar, 2008, p. 235 - 249.

Nascimento psíquico e contemporaneidade: implicações metapsicológicas nos modos de estruturação subjetiva. Autoria: João Luiz L. Paravidini, Hélvia Cristine C. S. Perfeito, Adriana Fayad Campos, Tiago Humberto R. Rocha, e Andréa G. Faria. Publicado na edição de volume VIII, nº 1, da revista Mal-estar e Subjetividade (ISSN 1518).

Estágios Supervisionados:
- Supervisão de estágio: Psicologia do Esporte (9º período Psicologia). Local do estágio: Esporte Clube Mamoré (futebol).
- Orientação Grupo de Estudo: Psicanálise e Corpo (alunos de vários períodos da Psicologia), no período de Agosto/2009 a Dezembro/2010
- Orientação de Projeto de Extensão: Psicologia do Esporte. Local do projeto: Patos Tênis Clube (PTC) com equipe juvenil de voleibol; início em setembro de 2011